Mudanças climáticas e redução da pobreza compõem o debate sobre Combate à Desertificação na Caatinga

Patrisia Ciancio | 21 de junho de 2021

Tema articula esfera regional com agendas globais sobre mudanças climáticas, conservação da biodiversidade e desenvolvimento social

O debate promovido pelo PRS Caatinga no Dia Mundial de Combate à Desertificação, 17 de junho, em uma mesa redonda virtual com especialistas, mostrou que a defesa do bioma depende do diálogo constante entre o Estado, a sociedade, as instituições de ensino e pesquisa e os arranjos de cooperação, passando por temas como as mudanças climáticas e o combate à pobreza. A Agenda 21 prevê ações regionais e, mais recentemente pretende-se, na Agenda 2030, que mais de 1 bilhão de hectares sejam recuperados. A Organização das Nações Unidas (ONU) definiu a década de 2021-2030 como a Década da Restauração de Ecossistemas.

O diretor do PRS Caatinga, Pedro Leitão, anunciou durante o evento o apoio a 20 propostas de adoção de tecnologias agrícolas de baixo carbono. Para tal, o PRS Caatinga, em parceria com a Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), está promovendo um processo formativo para 600 profissionais ligados à produção rural, especialmente assistentes técnicos e extensionistas rurais. A ideia é que eles estejam aptos a trabalhar com produtores rurais para aplicar tecnologias de baixa emissão de carbono, além de apoiar o acesso a mercados.

“Estamos criando redes, que serão um dos legados do nosso projeto. Redes de pesquisadores, de profissionais de assistência técnica e extensão rural, de instituições. Além disso, as propostas apoiadas pelo PRS Caatinga receberão apoio na aquisição de bens coletivos, como máquinas, equipamentos, sementes, mudas etc”, disse Leitão.

O mediador do evento, o coordenador regional do PRS Caatinga, Francisco Campello, contextualizou a data criada em 1994 pelas Nações Unidas por meio de uma convenção. E sublinhou a necessidade de cooperação com órgãos de governo para impactar positivamente a criação de políticas públicas de combate à desertificação.

“Quando falamos de desertificação estamos falando de mudanças do clima”, disse na abertura do evento, a coordenadora Geral de Mudanças do Clima do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Fabiana Villa Alves, que detalhou os objetivos do PRS Caatinga na mitigação das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) na agropecuária e na ampliação da renda de pequenos e médios produtores com a promoção de tecnologias de baixo carbono, consideradas no Plano ABC, que trata da agricultura de baixo carbono.

“Hoje a nossa meta é de mobilização de 1.500 produtores rurais recebendo assistência técnica; e dos 600 hectares promovendo recuperação de pastagens degradadas, um terço seriam por meio de sistemas de Integração Lavoura, Pecuária, Floresta (ILPF). Além da recuperação de 200 hectares de vegetação nativa”, ressaltou a gestora, que citou ainda técnicas imprescindíveis como os sistemas agroflorestais, as florestas plantadas e o tratamento de dejetos.

Um novo olhar sobre a Caatinga

O lado social da problemática da desertificação foi trazido à tona durante o debate. De acordo com Alexandre Pires, coordenador do Centro Sabiá e da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA), precisamos refletir na sociedade e na gestão pública uma mudança na lógica de pensar o semiárido brasileiro, que possa contribuir para reduzir as desigualdades, a fome e o empobrecimento das populações que vivem nesse contexto. “Fazer um debate sobre a Caatinga significa debater o acesso das populações rurais a condições mais dignas de viver nesse território”, afirmou o especialista, que detalhou ainda o trabalho feito com o Programa 1 Milhão de Cisternas (P1MC), para captação de água de chuva com emprego de Tecnologias Sociais no semiárido.

“O uso de água subterrânea, as cisternas, o reuso de água, enfim, o semiárido precisa de baixo carbono. E da valorização das populações. Vemos muitas empresas recebendo descontos no imposto de renda, por exemplo. O produtor que é captador de carbono e gerador de baixíssimas emissões precisa ser premiado”, disparou Salete Alves, pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Embrapa).

A cada 1 dólar investido em recuperação de ecossistemas o retorno é de 30 dólares de benefícios associados. Segundo Gertjan Beekman, coordenador do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), em outras palavras, “cuidar do solo e promover o controle de áreas degradadas e em recuperação também é um bom negócio”. Lembrando o cenário da pandemia, o especialista assinalou que sobretudo hoje a saúde se compreende de forma única: humana, animal e dos ecossistemas. E no caso da última, o manejo sustentável do solo é um pré-requisito.

O bioma Caatinga ocupa 862.818 Km2 de extensão, 10,1% do território nacional. Uma área que possui 62% de cobertura vegetal, sendo 58% classificadas como floresta. “Isso mostra uma potencialidade muito grande do bioma”, disse Gustavo Bediaga, coordenador do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A entidade está com editais abertos para o processo de conversão de multas. Ou seja, em vez de pagar a multa a empresa pode investir em projetos sustentáveis. “Isso é um meio de financiar boas práticas e a Caatinga está cheia de boas experiências”, disse Bediaga.

“O que se faz na Caatinga também é parte de uma agenda climática de combate à desertificação, de uma agenda de conservação da biodiversidade e também parte de uma agenda de desenvolvimento social. O PRS Caatinga quer revelar sua a potencialidade de contribuir para várias agendas e abrir portas para oportunidades de financiamento”, complementou Leitão.

Assista ao debate na íntegra em: https://www.youtube.com/watch?v=WFZXOTzQep0