Pobreza e mudança climática: duas faces da mesma moeda

Patrisia Ciancio | 9 de setembro de 2021

Diretor do PRS Caatinga relacionou questões ambientais e sociais ao clima em aula magna na UNIVASF

A pobreza e as mudanças climáticas estão interligadas e devem ser tratadas de maneira associada. As populações vulneráveis estão mais desamparadas em relação aos impactos de eventos extremos – como secas, incêndios e inundações -, e dispõem de poucos recursos para se adaptarem às novas condições impostas pela degradação ao meio ambiente. Esse foi um dos cenários apresentados durante a aula magna ministrada pelo Diretor do PRS Caatinga, Pedro Leitão, no dia 3 de setembro, para alunos da Universidade Federal do São Francisco (UNIVASF).

O evento foi transmitido pela RTV Caatinga e marcou o início das aulas dos cursos de Doutorado em Agroecologia em Desenvolvimento Territorial e Mestrado em Extensão Rural. Nas palavras da pró-reitora de Extensão da UNIVASF, Lucia Marisy, a parceria com o PRS Caatinga demarca uma série de objetivos comuns. “Estamos sempre pensando em algo que possa beneficiar as populações mais vulneráveis e reconstituir áreas degradadas na Caatinga. São ativistas, colegas, professores. Todos pensando em contribuir com a sociedade, reduzir a pobreza, a miséria, a fome e a desinformação”, ressaltou.

Juntas, a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS), executora do PRS Caatinga, e a UNIVASF estão investindo na formação de 600 profissionais em tecnologias agrícolas de baixo carbono, fortalecendo redes locais de conhecimento e fomentando a qualificação do mercado de assistentes técnicos e extensionistas rurais. Uma vez formados, estarão certificados para atuar com essa inovação em um bioma que já perdeu mais de 50% de sua cobertura vegetal e tende a ser uma das regiões brasileiras mais impactadas pela mudança climática. Segundo o último Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a elevação de temperatura na Caatinga nos próximos 50 anos gira em torno de 3 a 4°C.

A Terra é um organismo vivo

Em sua apresentação, Leitão desconstruiu o tema “Efeito estufa e seus impactos nas mudanças climáticas”, conectando a história da vida no planeta Terra, impactos das ações humanas, produção de conhecimento e mobilização de políticas globais e intervenções locais.

O Diretor do PRS Caatinga percorreu uma linha do tempo para narrar as transformações da vida na Terra, identificando que os principais impactos para o clima foram causados pela espécie humana, surgida no Holoceno, e principal causa do Antropoceno. Este termo foi criado por Paul Crutzen, Prêmio Nobel de Química de 1995, para descrever o período mais recente na história do planeta, quando as atividades humanas começaram a ter um impacto global significativo no funcionamento dos ecossistemas e do clima.

Desde a revolução industrial, os impactos das atividades humanas são muito significativos, principalmente pelo uso de combustíveis fósseis. O estrago não atinge somente a camada de ozônio; há mudanças no sistema oceânico, salinização de solos, desertificação, entre outros fenômenos que podem criar novos ciclos destrutivos ao interagirem entre si e cujas consequências são desconhecidas. O último relatório do IPCC foi categórico ao reconhecer a responsabilidade das atividades humanas no aquecimento de 1,07ºC de um total de 1,09ºC. Além disso, o documento acendeu um alerta vermelho no que diz respeito aos efeitos irreversíveis de algumas agressões cometidas contra o meio ambiente.

Relação entre o global e o local

A retrospectiva também percorreu momentos decisivos e históricos do debate sobre como aliar desenvolvimento e meio ambiente ao longo dos últimos cinquenta anos e que alicerçam a agenda climática global, com acordos e convenções, e políticas públicas nacionais, como o Plano ABC, que define ações para promoção da agricultura de baixo carbono no país.

Durante a aula, Leitão lembrou marcos como a Conferência Rio 92, que teve uma expressiva participação de governos e da sociedade civil debatendo a questão ambiental. “Discute-se pela primeira vez a relação entre global e local. Os impactos causados localmente pela ação humana têm repercussão global e isso pode ser visto claramente com a questão da emissão de gases de efeito estufa”, enfatizou.

Da série de documentos que resultaram da conferência, Leitão ressaltou a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB, 1992), ratificada pelo Congresso Nacional, e que prevê a conservação da diversidade biológica (ou biodiversidade), o seu uso sustentável e a distribuição justa e equitativa dos benefícios advindos do uso econômico dos recursos genéticos, respeitada a soberania de cada nação sobre o patrimônio existente em seus territórios.

Ações locais: o PRS Caatinga

Finalizando o passeio pela linha do tempo, Leitão citou um working paper do World Resources Institute (WRI) como uma das inspirações para o PRS Caatinga. Segundo o Diretor, o projeto colabora com os objetivos de mitigação da emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) e adaptação às mudanças climáticas a partir de uma ação estratégica de suporte que investe em capacitação, financiamento e transferência de tecnologia e cooperação.

“Incentivamos a adoção da agricultura de baixa emissão de carbono na Caatinga e convidamos a UNIVASF a difundir e produzir conhecimento sobre essa nova forma de produzir alimentos. Quando parte dos assistentes técnicos formados pela universidade começarem a atuar em Arranjos Produtivos Locais apoiados pelo projeto, eles estarão implementando essas inovações na região. Também temos como meta criar um fundo para que o nosso trabalho tenha o seu legado garantido e possa haver a continuidade -, finalizou o Diretor do projeto.

Assista ao evento na íntegra no canal da RTV Caatinga no YouTube