PRS Caatinga incentivou a igualdade de gênero no campo

Juliana Braga | 8 de março de 2024

Mais de 2.500 mulheres participaram de iniciativas que estimularam protagonismo feminino

A mulher é a base da agricultura familiar brasileira. No semiárido, um número expressivo delas encontra-se à frente das famílias produtoras. Esta realidade refletiu-se no Projeto Rural Sustentável Caatinga (PRS Caatinga): dos 5.072 participantes, 2.511 eram mulheres.

“Já em sua concepção, o projeto previa uma maior inclusão econômica e social das mulheres. Várias iniciativas permitiram isso - desde a oferta de insumos agrícolas, que facilitaram o trabalho no campo, às capacitações”, lembra a coordenadora administrativa financeira, Liana Gemunder.

Essas ações tiveram um impacto enorme na dinâmica das famílias rurais. Muitas matriarcas passaram a ter mais protagonismo em suas propriedades. “Antes, o papel das mulheres era ajudar os maridos, levando comida ou fazendo pequenas tarefas. Com o projeto e as capacitações, vimos cada vez mais mulheres assumindo funções na produção rural”, conta a coordenadora técnica do Arranjo Produtivo Local (APL) Centro de Estudos Ligados à Técnicas Alternativas (CELTA), Maria Ascelina Batista, que atua no Piauí.

TecABC gerou mais renda para toda família

A adoção das Tecnologias Agrícolas de Baixo Carbono (TecABC) promovida pelo projeto permitiu um cultivo mais diversificado e, consequentemente, uma fonte de renda mais estável para toda a família. “Como técnica, posso dizer que o projeto teve participação, direta e indireta, 80% feminina. Os produtores com suas esposas e filhas implementaram esse sistema juntos, em equipe”, recorda-se a coordenadora técnica Ana Reis Rodrigues do APL Cooperativa Mista dos Apicultores da Microrregião de Simplício Mendes (COMAPI), no Piauí.

Para alguns APLs parceiros do PRS Caatinga, a participação feminina já era uma realidade. A Associação Comunitária Terra Sertaneja (Acoterra) desenvolve há 16 anos um trabalho junto a comunidades extrativista de licuri (Syagrus coronata) que impacta diretamente 125 mulheres de sete comunidades rurais e três municípios da região nordeste da Bahia. A palmeira sertaneja produz o “ouro verde do semiárido”, como é conhecida a amêndoa rica em óleo e de grande potencial para aplicações farmacológica, cosmética e gastronômica.

A parceria entre a Acoterra e o PRS Caatinga impulsionou a produção de derivados do licuri, que se tornaram grande fonte de renda para as extrativistas. “Antigamente, catávamos o licuri, mas a gente jogava fora porque não tinha quem comprasse. Com esse projeto, conseguimos vender tudo,” afirma a produtora Alaide dos Santos Monteiro, da comunidade de Pau de Colher.

Apicultura – uma atividade feminina

A apicultura também foi uma atividade com grande inclusão feminina. “A Fundação Araripe, dentro do PRS Caatinga, conseguiu criar um grupo de mulheres que produzem mel, independentemente da participação masculina”, lembra a técnica e engenheira florestal do APL, Aline Freire. A agricultora Maria Luiza Souza Silva é uma das que resolveu investir no setor. “Por conta do projeto, comecei a trabalhar com apicultura e estou na expectativa de ter a minha primeira florada”, diz.

Também foram elas quem muitas vezes “bateram o martelo” com relação à adesão ao projeto. “Foi meu filho quem me falou sobre o PRS Caatinga. Quando soube que traria benefícios para a gente, decidi que entraríamos”, lembra a agricultora Osvaldina Paixão, que produz para a subsistência da família com o apoio do APL Obra Kolping, no Piauí.

O PRS Caatinga encerrou suas atividades de implementação em setembro de 2023, mas seu legado de conhecimento e promoção da conservação do bioma permanece. São sementes da agricultura regenerativa cultivadas por homens e mulheres, cujos frutos já estão sendo colhidos pelas novas gerações. “O projeto me ensinou a ter um olhar com muito mais amor sobre o que eu faço desde menina. Eu sei e acredito que é a agricultura que mantém o alimento na mesa. Com a tecnologia (ABC), veio esse despertar de como produzir sem desmatar. Vimos que havia uma rentabilidade para nossa família, o que fez com que os nossos filhos tenham mais amor pelo que a gente faz”, reflete a agricultora Neuma Alves, associada ao APL Instituto Terra Viva, de Alagoas.